Como os horários certos para comer afetam o desempenho e o bem-estar de crianças e adolescentes
A gente vive cercado de listas sobre “o que” crianças e adolescentes devem comer, mas pouca gente fala sobre quando comer. E isso pode estar fazendo toda a diferença no comportamento, no sono e até no rendimento escolar dos nossos filhos. O corpo humano funciona com base em ritmos biológicos — ciclos naturais de cerca de 24 horas — que regulam funções como digestão, metabolismo, sono, disposição e produção hormonal. Comer fora de hora desorganiza esses ritmos. Comer nos horários certos ajuda o corpo a funcionar com mais eficiência.
Esse campo da ciência, chamado crononutrição, mostra que nossos horários biológicos não são apenas sobre dormir e acordar. Eles também afetam como os nutrientes são digeridos e aproveitados. Por exemplo, o organismo está mais preparado para metabolizar alimentos durante o dia do que à noite. Por isso, refeições noturnas tardias sobrecarregam o sistema digestivo e atrapalham o sono.
A nutricionista Priscila Pilon, da Escola do Futuro Brasil, alerta: “Crianças e adolescentes são muito sensíveis ao ritmo do corpo. Quando eles pulam refeições ou comem fora de hora, o organismo reage com cansaço, irritabilidade, falta de foco e, em muitos casos, desequilíbrio hormonal”. Segundo ela, a organização dos horários das refeições pode ser tão importante quanto a própria qualidade do alimento.
Não se trata de criar uma rotina rígida, mas de ensinar o corpo a esperar e aproveitar melhor os nutrientes — no tempo certo.
Café da manhã e desempenho escolar: começar o dia com energia muda tudo
Depois de passar a noite em jejum, o corpo precisa de combustível para iniciar as funções básicas. Isso inclui o cérebro. Quando uma criança sai de casa sem comer, ela começa o dia com os níveis de glicose lá embaixo — e o resultado é previsível: menos atenção nas aulas, raciocínio mais lento, mais sono e até um humor difícil de lidar.
Pesquisas recentes mostram que adolescentes que tomam um café da manhã equilibrado têm melhor desempenho em provas e maior capacidade de concentração. A explicação é simples: essa primeira refeição fornece energia para o cérebro funcionar, regula a liberação de neurotransmissores como a dopamina e estabiliza o apetite ao longo do dia.
“Muita gente diz que o filho não sente fome de manhã, mas na verdade isso é resultado de uma rotina desorganizada. Com o tempo e pequenas mudanças, o corpo se adapta. Um café da manhã com pão integral, ovo mexido e fruta já é o suficiente para reequilibrar o organismo”, explica Priscila.
Além de melhorar o desempenho escolar, o café da manhã reduz a vontade de exagerar no lanche da escola, ajuda a manter o humor mais estável e colabora para um padrão alimentar mais saudável no restante do dia.
Jantar tardio e sono leve: os riscos de comer pesado à noite
À noite, o corpo começa naturalmente a se preparar para descansar. A produção de melatonina aumenta, a temperatura corporal cai e o metabolismo desacelera. Comer muito nesse período — especialmente refeições gordurosas, açucaradas ou pesadas — exige mais do sistema digestivo e atrapalha esse processo de descanso.
O problema é que esse hábito é muito comum em famílias com rotinas agitadas. Jantares depois das 21h, com pratos cheios de massas, carnes pesadas ou alimentos ultraprocessados, acabam comprometendo a qualidade do sono. E o sono ruim, como sabemos, bagunça o dia seguinte: mais cansaço, menos paciência, menos foco.
“Dormir com o estômago cheio atrapalha a produção hormonal da noite e prejudica o sono profundo, que é fundamental para a recuperação física e mental das crianças. Isso pode parecer um detalhe, mas se repete todos os dias e vira um ciclo vicioso de má alimentação e mau descanso”, explica Priscila.
O ideal é jantar até duas horas antes de dormir. Alimentos leves, como sopas com vegetais, arroz integral com legumes ou um prato pequeno com proteínas magras, já são suficientes para nutrir sem atrapalhar o sono.
Organização e rotina alimentar: como alinhar horários e melhorar o bem-estar
Criar uma rotina alimentar com horários fixos pode parecer difícil no início, mas os benefícios são perceptíveis em pouco tempo. Quando o corpo entende que vai receber comida em horários regulares, ele se regula. A fome aparece na hora certa, o intestino funciona melhor, o sono se torna mais profundo e o humor mais equilibrado.
Priscila Pilon comenta: “O corpo gosta de previsibilidade. Comer todos os dias em horários parecidos ensina a criança a se conectar com sua própria fome e saciedade. Isso previne tanto o comer emocional quanto a recusa alimentar”. Essa organização não precisa ser inflexível, mas deve manter uma estrutura mínima: café da manhã pela manhã, almoço entre meio-dia e 13h, lanche à tarde e jantar até as 20h.
Evitar longos períodos em jejum também é essencial. Crianças que passam muitas horas sem comer tendem a chegar às refeições com mais ansiedade, o que favorece escolhas impulsivas ou exageros. Manter lanches saudáveis por perto ajuda a manter o equilíbrio.
Mais do que uma questão de nutrição, respeitar o tempo do corpo é um jeito de cuidar da saúde integral. Com pequenas mudanças nos horários das refeições, já é possível perceber melhorias reais no desempenho escolar, na qualidade do sono e no equilíbrio emocional dos nossos filhos. Comer bem é, sim, importante. Mas comer na hora certa é o que ajuda o corpo a funcionar como ele realmente deve.





